sábado, 11 de agosto de 2012

O primeiro milho é dos pardais

Ganchos de meia em madeira, exemplares de arte pastoril alentejana
(Séc. XX). Da esquerda para a direita: Gancho articulado com uma bolota,
numa peça única (7,1 cm). Gancho articulado com um cesto, igualmente
numa peça única (5,2cm);  Colecção do autor.

O Mercado das Velharias em Estremoz é um dos ex-líbris desta cidade transtagana. Mesmo em períodos sazonais mais fracos, como é caso do mês de Agosto, surpreende-nos pela positiva. E eu que o diga.
Hoje, ainda a manhã era uma menina, pelas sete e vinte nove, recebo no meu computador, uma mensagem enviada via telemóvel, pelo meu amigo Charles. A mensagem tinha dois anexos. Um de imagem, mostrando um curioso exemplar de arte pastoril, mais precisamente uma colher. O outro de texto, com a seguinte mensagem: - Bom dia de compras....hoje valeu a pena.....
- Então vocês não querem lá ver? O Charles queria-me atazanar, porque partiu de manhã cedo para Lisboa, mas antes passou pelo Mercado das Velharias e comprou a colher, porque eu não tinha ainda passado por ali.
Se a minha prima Hifigénia fosse viva, decerto que do cimo da sua cátedra popular, diria ao Charles:
- O primeiro milho é dos pardais.
E eu creio que essa seja uma verdade inescapável. À hora da recepção da mensagem, já eu tinha nas linhas dos meus dedos, quase duas horas de teclado de computador, a minha forma de dedilhar a guitarra portuguesa que me vai na alma. Muitas vezes sou dos primeiros a chegar ao Mercado das Velharias. Hoje não aconteceu assim, porque outros valores mais altos se alevantaram. Eu tinha de escrever, porque se um homem não escreve, acaba por rebentar. Foi assim que fui para o Mercado, já a manhã era uma jovem promissora. E por ali deambulei como sempre, qual alquimista que demanda a pedra filosofal transmuteadora. Por ali sou conhecido e faço parte da mobília. Creio que até sou respeitado e tido como um entendido em várias áreas. Por vezes sou até mesmo consultado e emito opiniões e forneço pistas que se revelam benévolas para vendedores, os quais mais tarde me agradecem a disponibilidade revelada pelo franqueamento desinteressado do vasto arsenal da minha memória de elefante, da minha abastada biblioteca ou das minhas vastas referências bibliográficas. Daí que não seja de estranhar que alguns sejam gentis para comigo, tal como eu sou para com eles. O amor às velharias é isso mesmo: é feito de cumplicidades, de partilha de informação e de emoções que por vezes nos caem fundo na “cacha do pêto”.
Hoje aconteceu que alguém, que eu mentalmente já registara como vendedor de rara sensibilidade, me disse no momento exacto em que cheguei à sua banca:
- Professor, tenho aqui umas peças que decerto serão do seu agrado.
Mostrou-mas e eu perguntei:
- Quanto é?
- Faça o Professor o preço! – Respondeu o vendedor.
- Nem pense nisso! As peças são suas. O Senhor é que tem de lhe atribuir um valor. – Repliquei eu.
- Assim seja. – Respondeu o vendedor, que me propôs um preço mais que razoável. E lá fechámos negócio e decerto reforçámos a nossa amizade, porque prestámos mutuamente um serviço um ao outro. Ele vendeu e eu comprei. Foi um acto de partilha em torno de peças, das quais ambos sabemos o significado, o contexto e a temporalidade, mas perante as quais temos posturas diferentes. Exactamente porque um é vendedor e o outro é comprador.
É chegada a altura de dizer o que comprei. Tratou-se de dois belos ganchos de meia em madeira, exemplares de arte pastoril alentejana (Séc. XX). A sua beleza e delicadeza suplantam a da colher comprada pelo meu madrugador amigo Charles. Parafraseando a minha prima Hifigénia, é caso para lhe dizer:
- O primeiro milho é dos pardais!


quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Poetas Populares de Estremoz

2º Encontro do Núcleo de Academias e Universidades Seniores "NAUS".
Espectáculo Cultura Viva no Teatro Bernardino Ribeiro.
Estremoz, 12 de Maio de 2012

Apresentação de Poetas Populares por Hernâni Matos, Presidente da AFA.

 
  Poeta Popular Aurélio Buinho (São Bento do Cortiço).


Poeta Popular Aurélio Buinho (São Bento do Cortiço).


Poeta Popular Renato Valadeiro (Arcos)


Poeta Popular Manuel Gomes (Arcos)



Hernâni Matos
(Vídeos de   MEMÓRIA MÉDIA, eMuseu do Património Imaterial) 

domingo, 5 de agosto de 2012

Azulejos da Estação da CP de Estremoz


Mercado de sábado: os barros. Ao fundo e ao centro, o Castelo de Estremoz.
À direita, os campanários da extinta Igreja de Santo André.

A arte do azulejo herdada dos árabes, enraizou-se entre nós no século XVI, fruto da prosperidade económica resultante da expansão marítima portuguesa, que permitiu a construção de igrejas e palácios. Estes foram decorados interiormente com cenas sagradas ou profanas, que por vezes também ornamentam alguns jardins de palácios.
No século XX, o azulejo sai definitivamente para rua e passa a decorar fachadas de residências, edifícios públicos, lojas, estações e mercados. Foi o que aconteceu com a Estação da CP em Estremoz, decorada com painéis azulejares policromáticos da autoria de Alves de Sá (1), datados de 1940 e fabricados na Fábrica de Cerâmica da Viúva Lamego, em Lisboa. Trata-se de quadros de grande qualidade artística que num estilo muito barroco, contam o dia-a-dia da cidade de Estremoz e registam as fainas agro-pastoris no segundo quartel do século XX. As cenas alternam com vasos carregados de flores e frutos, motivos que também figuram na cercadura, a qual é encimada por um cesto repleto daquelas espécies. São quadros que nos permitem uma viagem espaço-temporal à época da Exposição do Mundo Português, já que constituem um repositório dos usos e costumes locais na 1ª metade do século XX. Para muitos de nós, estes azulejos, conjuntamente com os do Palácio Tocha e da Câmara Municipal de Estremoz, foram o nosso primeiro livro de banda desenhada.
Dado que alguns painéis foram vandalizados, não seria possível promover a sua recuperação a partir de fotografias existentes ou dos estudos do artista que deram origem aos painéis? Aqui fica o alvitre a quem de direito. Seria ouro sobre azul, já que a autarquia pretende instalar um espaço museológico ferroviário, no antigo edifício da estação da CP de Estremoz.

Hernâni Matos
Publicado inicialmente em 5 de Agosto de 2012 

(1) - João Alves de Sá (1878-1972), que exerceu episodicamente a magistratura, foi como aguarelista, discípulo de Manuel de Macedo (1839-1915), tendo sido agraciado com elevadas distinções como a medalha de honra em aguarela da Sociedade Nacional de Belas Artes e o 1º prémio Roque Gameiro (1947), do Secretariado Nacional de Informação. Encontra-se representado no Museu do Chiado e no Museu da Cidade (Lisboa), na Casa-Museu dos Patudos (Almeirim), no Museu Grão Vasco (Viseu) e em diversas colecções particulares. Para além da aguarela, dedicou-se à cerâmica, realizando painéis azulejares que se encontram espalhados por vários pontos do país: Estações da CP de Estremoz, Rio Tinto e Vilar Formoso, bem como as salas de espera da Estação Fluvial de Sul e Sueste e a entrada do Governo Civil, em Lisboa.

A fachada da Estação da CP de Estremoz. 

A gare da Estação da CP de Estremoz, vista do lado de Vila Viçosa. 
 
A gare da Estação da CP de Estremoz, vista do lado de Évora.  

Ceifeiras. Ao fundo o Castelo de Estremoz. 

Porqueiro guardando uma vara de porcos.

 Mercado de sábado: os barros. 

Convento das Maltesas e zona do mercado das sementes, no decurso
do mercado de sábado. 

 Convento das Maltesas e zona dos churriões-tabernas, no decurso
do mercado de sábado.

Carros de tracção animal, à saída das Portas de Santo António. 

Carro de tracção animal, frente à fonte de São João de Deus, situada
 no alçado lateral esquerdo do  Hospital Real de São João de Deus.

 Fonte das Bicas e aguadeiros no Largo General Graça.  

  Fonte do Largo do Espírito Santo e aguadeiro.

Aguadeiro na subida da rua do arco de Santarém, em direcção ao Castelo.